quinta-feira, 21 de abril de 2011

Semana Santa

É bastante simbólico que no Domingo de Ramos, em que os cristãos começam a celebrar a Semana Santa, França e Itália iniciaram uma disputa diplomática, quando a França impediu a entrada em seu território de um trem vindo da Itália com cerca de 60 imigrantes tunisianos.

Não é de hoje que o Velho Continente dá sinais de senilidade, tomando atitudes xenofóbicas com relação a refugiados de países africanos e/ou muçulmanos que fogem da pobreza e buscam abrigo nos países europeus. O que essa briga diplomática bem no início da semana santa pode simbolizar é que o cidadão europeu típico, geralmente cristão, em momentos de crise econômica e apatia dos setores da esquerda, é facilmente seduzido pelo discurso da extrema direita e acaba colocando a culpa da crise nos imigrantes.

No Brasil, é política do governo dar, de tempos em tempos, anistia aos estrangeiros que vivem irregularmente no país, garantindo a eles acesso aos documentos necessários para trabalharem de maneira digna em solo nacional. Podemos nos orgulhar disso, mas devemos lembrar que não estamos livres do discurso preconceituoso da extrema direita. Só precisamos lembrar para onde se encaminhou o debate eleitoral ano passado e de como ainda existem pessoas dispostas a votar em políticos como Bolsonaro.

Como cristão, é triste ver que aqui no Brasil, como na Europa, é geralmente entre grupos de pessoas que se dizem seguidores de Cristo que o discurso da intolerância pregado pela extrema direita encontra terreno fértil. Conheço alguns ateus que dedicam boa parte do seu tempo livre a defender causas que se enquadram na mensagem de Cristo de amor ao próximo, e é pensando nelas que busco conforto espiritual quando vejo pessoas que se dizem cristãs proclamando palavras de ódio ao próximo.

No último show em São Paulo, Bono Vox, em um explícito elogio as políticas de distribuição de renda adotadas pelo governo brasileiro nos últimos anos, disse (em uma tradução livre) “O valor de uma sociedade pode ser medido na maneira em que ela trata os mais pobres e os mais frágeis”. Independente das críticas que podem ser feitas às políticas de distribuição de renda do governo e ao ativismo do Bono, a frase não deixa de ter seu valor. Devemos refletir qual é o caminho que queremos dar a nossa sociedade: se é o caminho do amor ao próximo (que hoje se traduz na defesa dos direitos humanos, no combate a desigualdade social e no fim da miséria), ou o caminho da intolerância, tão bem exposto nas políticas xenofóbicas do governo de Sarkozy, como nas palavras de intolerância que escutamos o deputado Bolsonaro pronunciar.

domingo, 3 de abril de 2011

"Mundo Pequeno"

Uma conhecida contava que vez ou outra, quando criança, o pai levava ela e sua irmã a Central do Brasil pela manhã, um dos horários mais cheios, com o propósito de mostrar para as filhas quem “trabalha de verdade no Brasil”.

Quando ainda na faculdade eu percebia que boa parte dos meus colegas já se conhecia ou tinham amigos em comum, uma vez que vinham de um número reduzido de colégios. Como eu morava em outra cidade todas as pessoas eram novas para mim, e tanto os poucos alunos que vinham do subúrbio, quanto a maioria que vinha dos bairros mais nobres (e da lista reduzida de colégios) eram igualmente estranhos no meu convívio.

Entrando no mercado de trabalho as coisas não mudaram muito e quase em toda reunião que envolve engenheiros e arquitetos de diferentes empresas eu presencio o encontro de antigos colegas de colégio e/ou faculdade que se saúdam com a famigerada expressão “mundo pequeno”. Para alguém que cresceu em uma cidade de 200 mil habitantes, e que já achava ela com um porte razoável, foi curioso ver que em uma cidade de mais de 6 milhões de habitantes são sempre as pessoas de mesma origem que ocupam as mesmas posições e logo eu percebi que o mundo não é pequeno, mas sim a renda que é concentrada.

Sendo filho de um imigrante que a vida o faz enquadrar-se no que os americanos chamam de “Self-Made Man” eu não posso negar que a ascensão social existe, mas ao longo da vida eu percebi que as pessoas que conseguem escalar economicamente são exceções a regra que diz que se você nasceu fora dos círculos economicamente melhores, é lá, fora desses círculos, que você vai passar a sua vida.

Na Universidade Federal, no curso de Engenharia (até hoje um dos mais elitistas), eu percebia que meus colegas se agrupavam em círculos de amizade que quase sempre refletia os bairros em que cada um morava e de tabela a condição financeira de cada um. Os poucos que vinham de bairros do subúrbio (o que não quer dizer que necessariamente tinha a situação financeira pior) é que tinham noção que toda a manhã uma massa de trabalhadores se aglomera nos trens da Central do Brasil e vai trabalhar de verdade.

Ao longo do meu crescimento profissional eu tento não esquecer que a sociedade é maior que o grupo com qual eu convivo profissionalmente, mas antes que eu me esqueça acho que devo dedicar uma manhã para uma visita a Central do Brasil, para ver o verdadeiro Brasil indo trabalhar.